sexta-feira, março 31, 2006

Hoje é Sobre Jornalistas

Sempre que posso à 6ª Feira faço os possíveis para voltar para casa entre as 19.00hs. e as 20.00hs. por forma a estar sintonizado na RDP. Deleito-me a ouvir o “Contraditório” um “bate papo” sobre a nossa política feito pelos simpáticos e canhotos jornalistas Luís Marinho, Ana Sá Lopes, Carlos Magno. Convém referir que a minha crescente maturidade me incompatibilizou com a Rádio Bagdad (por alguns conhecida por TSF), pois quando posso ainda escolho quem me moa o juízo. Ás sextas feiras os dramas da nossa política divertem-me, mais com a abordagem quase literária do fabuloso Carlos Magno. Mesmo com as suas equivocadas posições existenciais e políticas. Mas o que me deixa apreensivo é mesmo o Luís Delgado. Ele é o contraditório?! No jornalismo em Portugal é este o “escolhido” representante do “centro direita”? Até na SIC Notícias é sempre ele. Porquê? Ele fala e fico sempre com a sensação que o importante ficou por dizer...
PS. Quando ouço a Ana Sá Lopes não consigo deixar de pensar no “raio” da Vanessa...

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Parem as máquinas

Freitas do Amaral pediu asilo político ao Canadá alegando ser perseguido em Portugal. Governo de Otava recusou o apelo e decidiu repatriá-lo para Lisboa. Sócrates comentou: "Simplex. Dura lex seda lex."

Para além da ID



Leio por aí que o último leilão do Palácio do Correio Velho, onde trabalha o Rodrigo (e onde trabalhou outra amiga minha), foi um sucesso. Desta vez, não foram os quadros ou os móveis a serem disputados pelos grandes coleccionadores. Mas exemplares únicos das revistas Occidental e da Orpheu, que foram arrematadas por mais de dois mil euros cada uma. Na primeira o Eça publicou o "Crime do Padre Amaro", a segunda teve direcção de Pessoa e M. de Sá-Carneiro.
No Porto, o homem que ainda não conseguiu chegar a acordo com o Estado para encontrar um lugar digno para a sua vasta colecção vai expor algumas das suas imensas preciosidades. A partir de hoje em Serralves podemos ver a Berardo Déco. Afinal, o País não é só investimento em ID e em Ciência. Aliás, veremos se os comentadores de serviço também dizem que os portugueses não almoçam ID nem jantam Ciência...

Grande reforço

O João Távora junta-se a nós, reforçando a quota de monárquicos e sportinguistas, que até agora só incluía, pelo que sei, a minha pessoa (nesta feliz conjugação). Tem ainda como grande virtude não ser jornalista. Esperamos muito dele, tal como da Isabel que, apesar de jornalista, é boa pessoa.

Definição

Quota Contribuição de cada pessoa para determinado fim. Definição encontrada no Grande Dicionário Porto Editora. Agrada-me. E ainda me agrada mais a de quota disponível parte da herança que excede a legítima...

Primeira "posta"

Estou in. Sem fitas.

Registe-se


O "Corta-fitas" já não é um espaço só de homens. Agora temos connosco a Isabelinha. Posso garantir-vos que a adesão estava programada e combinada há muito tempo e que não tem nada a ver com a estafada estória dos 33,3%. Porque no caso dela, tem a ver com mérito.

É só para ela

"As mulheres no CDS podem aceder a qualquer cargo", garante Teresa Caeiro, solitária presença feminina na bancada parlamentar do CDS.

Menina não entra

"Nós, no PCP, sempre valorizámos o trabalho político das mulheres", diz Odete Santos. Se fosse exactamente assim, a veterana deputada comunista já há muito integraria os organismos centrais do partido - Comissão Política e Secretariado - onde continua a não ter assento tantos anos depois, tal como a sua camarada Luísa Mesquita, a outra deputada do PCP.

A minha gabardina (crónica)

A minha gabardina azul tem um corte antiquado, manchas de cor desvanecida, mangas demasiado curtas. Quando foi à lavandaria, a empregada disse: “Tem a certeza de que quer mandar limpar e impermeabilizar? Custa-lhe muito dinheiro e quase que podia comprar uma nova”. Sim , claro, eram bons argumentos, mas não seria a mesma gabardina.
Os tempos mudaram e, hoje em dia, veste-se de forma diferente do que na altura em que a comprei. Aquele foi um caso de imediato pronto a vestir, nem sei explicar, como nos acontece em paixões que levam tudo à frente, do bom senso ao juízo propriamente dito. Era barata e sem marca. Olhei para ela e vi todos os defeitos, não resistindo talvez em me olhar ao espelho. Seriam de certa maneira também os meus próprios erros: a forma algo anacrónica, uma espécie de orgulho em excesso (as gabardinas não podem ter tal coisa, mas foi o que vi!). O azul ficava-lhe bem e, na juventude resplandecia, sobretudo quando a luz do sol lhe batia num certo ângulo. (Já vejo os leitores a rirem das minhas frases disparatadas; o sol a incidir numa gabardina é um pobre fracasso de função).
As vestimentas querem-se janotas e sem conteúdo, de grafismo impecável e pouca alma; coisas que se possam descrever em poucas palavras, catitas e modernaças. Acima de tudo, a roupa serve para esconder o indivíduo atrás de um hábito que transfigura o ser em algo de efémero e distinto de si, que pensa apenas na sensação súbita de percorrer uma rua e sentir-se o alvo da admiração alheia. A satisfação do ego justifica a marca, símbolo de ascensão. O traje deve ser ambicioso e contemporâneo.
A minha pobre gabardina não tem nenhum destes empregos. Não serve para muito, pois a impermeabilização fracassou. Mas é esta a sua história, até agora. É uma gabardina em desuso, pois elas querem-se de cor beije ou vagamente creme. Aliás, já passou o tempo das gabardinas. É isso, passou o seu tempo.
Um dia, tenciono falar-lhes aqui das minhas botas; contar algumas das suas aventuras em vários cenários. É pena que elas também já estejam fora de moda.

Longe da vista

Assisti na Assembleia da República ao debate sobre as quotas femininas nas listas eleitorais. Às 16 horas, a meio da prometedora discussão, havia no plenário só 67 (em 121) parlamentares do PS, 30 (em 75) do PSD, oito (em 12) do PCP, quatro (em 12) do CDS e seis (em oito) do Bloco de Esquerda. Os restantes estavam ausentes em parte incerta.

Governo misógino quer "paridade"

Um governo com apenas duas mulheres entre 17 ministros e só três secretárias de Estado num elenco de 31 fez votar no Parlamento uma lei da "paridade" contra a "subrepresentação" feminina nas listas eleitorais de todos os partidos. Se a hipocrisia pagasse imposto, o Executivo Sócrates iria à falência...

quinta-feira, março 30, 2006

Dicionário de politiquês (XIV)

Convergência. Ala esquerda do PSD e ala direita do PS aliam-se para aprovar pactos de regime e "reformas estruturais", sob a bênção simultânea de Belém e de São Bento, até à definitiva fusão dos dois partidos. Sinónimo de união nacional.

A propósito da Lei da Paridade


Quotas por oposição ao mérito...

O laicismo em perigo

Um cardeal foi visto a menos de 50 metros de distância do deputado Fernando Rosas.

Discípulo de Gabriel Alves

Marcelo Rebelo de Sousa não perde uma. Terça à noite, logo após o apito final do Benfica-Barcelona, lá estava ele sentado na cadeira dos comentadores desportivos falando longamente sobre o jogo na RTP-N. Comparou Moretto a alguns dos seus alunos, chamou "mestre" a Gabriel Alves, anteviu que a segunda mão no Camp Nou "vai ser difícil" e elogiou Ricardo Rocha, que "secou sistematicamente o Ronaldinho". Ao ouvi-lo, assim tão efusivo, ia pensando que Cristo é bem capaz de descer à Terra ainda antes de 2009...

E vão quatro

Depois de Emídio Rangel, Alcides Vieira e Miguel Sousa Tavares, é agora a vez de Vicente Jorge Silva sair em defesa da Ordem dos Jornalistas. Num excelente artigo publicado na edição de ontem do DN. A ver aqui.

Blogues em revista (1)

O Franco Atirador: “Nunca compreendi as pessoas que tentam escrever como o Graham Greene ou como o Paul Bowles. A nossa obrigação é tentar escrever como o anjo que destruiu Sodoma e Gomorra. Tudo o resto é uma pura perda de tempo.” (Luís M. Jorge)

Random Blog 02: “A importância dos blogues revela-se na capacidade de fazer circular informação à margem da que nos querem vender.” (Tiago Mota Saraiva)

Gola Alta: “Há homens que deviam ser amados. Como os que trocam a cerveja pelo sumo de laranja, só para nos fazer a vontade.” (Sony Hari)

Quatro Caminhos: “O cavalheirismo sabe bem, mas não é uma boa ideia.” (Ana Claúdia Vicente)

Tomar Partido: "Urgente - Altere-se o artigo 13º da Constituição. Parece que vem aí uma lei que discrimina em função de ser mulher." (Jorge Ferreira)

Blogues em revista (2)

Jantar das Quartas: “O programa de Simplificação Administrativa e Legislativa do Governo tem nome de papel higiénico.”

No Cinzento de Bruxelas: “Mas alguém acredita num programa do Governo que se chame Simplex?”

Táxi: “Simplex. Kleenex, Scottex, Glassex, Olex, Moulinex. É na mesma linha, não é?” (Rita Tavares)

Tristes Tópicos: “Metade das calorias e o dobro do talento: depois de José Rodrigues dos Santos recolher os louros da sua obra-prima Codex 666, o Governo tenta a sua sorte e lança a genial sequela Simplex 333.”

Hoje Há Conquilhas: “A oposição anda tão por baixo que o PS tem de dar uma ajuda.” (Tomás Vasques)

Adufe: “A Margarida Rebelo Pinto é como o 605 Forte, uma marca... registada.” (Rui Cerdeira Branco)

quarta-feira, março 29, 2006

Canadá

O repatriamento de portugueses em situação ilegal no Canadá e a reacção dos media revela que Portugal já não está muito habituado aos dissabores da emigração. Esta falta de hábito é um dos efeitos positivos da integração europeia, embora isso não pareça assim evidente à primeira vista. Apesar de haver problemas com portugueses em situação precária e de grande exploração (por exemplo, na Holanda), a livre circulação de trabalhadores no espaço comunitário garante segurança mínima aos portugueses que emigraram para outros países europeus.
Portugal é hoje um país de imigração e não houve grande indignação quando as autoridades portuguesas aplicaram a lei nacional num restaurante perto do Jardim Zoológico onde centenas de brasileiros se divertiam em festas de grande visibilidade. Muitos destes imigrantes ilegais foram identificados e estarão a ser repatriados.
O episódio canadiano mostra também que há vantagens potenciais na futura existência de uma diplomacia europeia. Se, em vez de repatriar imigrantes ilegais portugueses, gregos e polacos, os canadianos tivessem como interlocutor a diplomacia europeia, penso que os interesses destas pessoas seriam defendidos de forma mais eficaz. Provavelmente, estes imigrantes nem estariam em situação ilegal.

Uma História de Violência


Fui ontem ver o último filme do homem aqui à direita (David Cronenberg). Chama-se "Uma História de Violência" (2005) e estreou há dias atrás. O dedo clássico do realizador só vem ao de cima quando se vêem as caras despedaçadas. Viggo Mortensen está excelente no papel do homem de família aparentemente pacato que esconde um assassino/mafioso debaixo da mesma pele. Mas Maria Bello (qualquer semelhança com a ex-deputada do PS e ilustre líder da maçonaria feminina é pura coincidência...) vale bem o bilhetinho que paguei no Alvaláxia. De uma beleza seca, faz-nos estremecer sempre que aparece no ecrã... até no fim, quando se percebe qual a sua decisão trágica. De Mãe e Mulher. Já agora, a visita a este cinema teve uma outra vantagem para mim: fiquei a perceber a razão para Felipe Soares Franco querer vender os cinemas e o centro comercial. Na sala, para além de mim, estavam quatro pessoas e uma imensa plateia de dezenas e dezenas de cadeiras vazias. Nas outras salas o mesmo. O centro comercial propriamente dito estava às moscas, com acessos muito difíceis que deixam qualquer um que não vá de carro (eu fui), e que não conheça o estádio do Sporting, à beira de um ataque de nervos. Assim não dá.

Amordaçar a liberdade

Boa Noite e Boa Sorte é uma fascinante digressão aos meandros do jornalismo americano no início da década de 50, quando a “caça às bruxas” desencadeada pelo senador Joe McCarthy estava no auge. A pretexto do combate ao comunismo, as liberdades democráticas chegaram a correr perigo neste período negro da história norte-americana. Para inverter a maré foi decisiva a actuação do credenciado jornalista Ed Murrow, da CBS, que teve a frontalidade de criticar o senador em directo no seu programa.
George Clooney filma deliberadamente a preto e branco, desenterrando uma estética que parecia morta e enterrada para acentuar o carácter dual dos desafios que então se punham: ou se estava abertamente a favor da liberdade de informação ou se estava liminarmente contra. Aquele período não era propício a neutralismos. No fundo, o que sucedeu há meio século serve para traçar um paralelo com a realidade actual: também hoje a liberdade de expressão está ameaçada a pretexto do combate tenaz ao terrorismo. Estas ameaças ocorrem quando e onde menos se espera. Compete a qualquer de nós, jornalistas ou não, enfrentá-las sem rodeios. McCarthy desapareceu, mas tem muitos discípulos de todos os matizes em vários continentes. Sempre prontos a inventar novos pretextos para concretizar um velho objectivo: amordaçar a liberdade.

Central de comunicação?

Quem não se lembra da vontade demonstrada pelos dois anteriores governos (no último mais esbatida porque nem era preciso...) de criar uma Central de Comunicação? Pois bem, com eventos (a ver vamos se passam disso) como o do "Simplex" está demonstrado que não é preciso uma central para se conseguir ter notícias nas televisões, nas rádios e nos jornais. Antes de mais é preciso que haja "receptividade" e essa está bem à vista. E muda tudo. Veremos quanto tempo dura, mas ou muito me engano ou a pouca vontade já demonstrada por Marcelo Rebelo de Sousa e Alexandre Relvas (na mesma semana, curiosamente) em disputarem a liderança do PSD (ou alguém por eles) tem a ver com isso mesmo. Há dias ouvi da boca de um importante player laranja que "até 2009 não há nada a fazer" e que Sócrates ameaça tornar-se num "novo Blair". No CDS a mesma coisa, com José Ribeiro e Castro mais preocupado em comentar a forma do que o conteúdo do "Simplex" com frases um bocadinho mais sexy... É isto.

Sou fã

Do programa Prazer dos Diabos (SIC Comédia, quartas, 22h30). Uma forma saudavelmente delirante de debater os temas da semana. Com humor irreverente em doses imoderadas. E o mais bonito sorriso da televisão portuguesa - o de Adelaide de Sousa. Um reparo: gosto menos do programa quando lá não está a Inês Meneses.

Pelo cano abaixo

Em noite de Benfica-Barcelona, transmitido em directo na RTP, a TVI apostou a fundo na contra-programação, prolongando o Jornal Nacional por 76 minutos. Com "notícias" como esta, que durou quatro minutos: "Roupa anticelulite faz sucesso no Brasil." Não há outro país da Europa com noticiários tão absurdos. O propalado acordo de auto-regulação celebrado pelas televisões para evitar estes disparates parece já ter ido pelo cano abaixo.

A última vitória de Sharon

Um homem em coma, agonizando num leito de hospital, ganhou a eleição legislativa em Israel. O homem é Ariel Sharon, o partido é o Kadima, que ele fundou poucos dias antes do irreparável problema de saúde que sofreu, em Dezembro. Uma perfeita metáfora para a tragédia de contornos surreais em que mergulhou o instável Médio Oriente.

terça-feira, março 28, 2006

Liberdade de expressão

Leio aqui e aqui: Margarida Rebelo Pinto e a Oficina do Livro accionaram uma providência cautelar para impedir a distribuição e venda da obra Couves & Alforrecas: Os Segredos da Escrita de Margarida Rebelo Pinto. Alguém aí falou em liberdade de expressão?

Sugestão para o CDS ser um partido muito mais sexy (3)


O Pedro pediu-me para não o deixar sozinho na árdua tarefa de encontrar uma solução para aquele partido que nos últimos anos se notabilizou por ser democrata-cristão às segundas-feiras, popular às terças (sobretudo se for dia de feira), liberal às quartas, centrista à quinta e conservador à sexta (porque se aproxima o fim de semana). Aqui fica o meu modesto contributo... Chama-se Letícia Birkheuer e tem a vantagem de falar a nossa língua, mas com sotaque do Brasil.

Os detalhes

O facto de alguns países europeus terem efectuado com êxito reformas económicas e sociais demonstrou a todos os outros que tinham urgência em realizar, por seu turno, mudanças significativas nas leis laborais ou na respectiva segurança social. O exemplo irlandês é óbvio. Medido em paridades de poder de compra, o PIB per capita irlandês, em 1986, era de 61% da média europeia. Em 2003, atingira 122% da média europeia (da UE15); no mesmo período, a Espanha passou de 70 para 90; e Portugal, de 55 para 68. Quando entrou na então CEE, Portugal estava a 6 pontos percentuais da Irlanda e a 15 da Espanha; hoje, está a 24 pontos da Espanha e a 54 da Irlanda. Estes são os custos da não mudança ou do receio de enfrentar grupos sociais instalados.
Todos os líderes da União Europeia sabem que devem fazer reformas e até sabem quais são as alterações imprescindíveis. O problema está em como fazer as reformas.
Os conflitos essenciais da Europa orbitam, hoje, em torno desta questão. Os governos tentam introduzir mudanças, por vezes até tímidas, e os grupos prejudicados lutam para as impedir. O quadro geral é que as leis laborais serão flexibilizadas a favor do patronato e as pessoas vão trabalhar mais cedo, durante mais tempo e até mais tarde. O problema dos Governos está em conseguir apurar os detalhes. Terão de fazer isto sem criar mais pobres e excluídos, o que custará dinheiro aos contribuintes.
Em resumo, os diferentes modelos sociais europeus não vão acabar. Estão todos em transformação e, no final do processo, a Europa terá uma economia dinâmica. Agora, imagine-se a influência mundial de uma UE com a competitividade da Finlândia e o bem-estar da Dinamarca.

Engraxadela

Bárbara Guimarães, num programa sobre livros que tem na SIC Notícias, recebeu Maria José Ritta. E não se limitou a falar com ela: deu-lhe uma monumental engraxadela. A ex-inquilina de Belém, assegurou Bárbara em jeito de introdução à entrevista, foi uma “notável mediadora de povos e culturas”, revelando-se “uma amiga de todas as horas”. Sem esquecer que “foi com notável convicção que assumiu o papel de primeira dama”.
Não ouvi até ao fim: nada há mais enjoativo do que este tom louvaminheiro muito em voga num certo “jornalismo cultural”. Com toda a franqueza, acho que nem o próprio Jorge Sampaio seria capaz de puxar assim tanto o lustro à sua dama.

A blasfémia do dia (XX)

Quem for a Meca leva com a moca.

Dilema resolvido

Acabei por ir ouvir a Helena Matos ao Hotel Lutécia. Ainda bem que o fiz: ela falou com o brilhantismo de sempre, alertando as pessoas contra a "culpabilização social" de que os pais hoje são vítimas a toda a hora. "Se há um filho com insucesso escolar ou que se torna toxicodependente, a culpa é sempre dos pais. Devemos lutar contra isto", diz a Helena, também revoltada contra os apelos implícitos ou explícitos ao regresso das mulheres "ao lar" nos tempos que correm, em que até os partos em casa são apontados como modelos. "Já repararam que nas novelas da TVI as mulheres que trabalham e têm uma carreira profissional são sempre as más da fita?", questionou. Confessando ter assumido "outra opção de voto" (em Cavaco) nas presidenciais, foi muito aplaudida nesta sessão dominada por apoiantes de Manuel Alegre. Só a deputada bloquista Helena Pinto, que também lá estava, não aplaudiu.

segunda-feira, março 27, 2006

Cherchez la femme

Nova incursão por blogues com marca feminina. Encontro vários a que vale a pena estar atento. Já mencionei antes os Tristes Tópicos, o Táxi, a Miss Pearls. Gosto também do que escreve a Sónia, na Gola Alta. E dos textos da Ana Cláudia, no Amigo do Povo. Sou leitor diário da Sofia, no blogue Defender o Quadrado. E da Carla, nesse original Welcome to Elsinore. Sem esquecer a Helena, com a sua Linha de Cabotagem. Mais alguns que justificam leitura demorada: Blue Notes, Complicadíssima Teia, Ecos da Falésia, A Morgadinha e There's Only 1 Alice. Todos a merecer visita.

General Alcazar

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, chamou "burro", "cobarde", "assassino", "genocida" e mimos equivalentes ao seu homólogo dos Estados Unidos, país com o qual mantém relações diplomáticas e ao qual continua a vender generosas doses de petróleo com a prodigalidade de sempre. O general Alcazar do Tintim não faria melhor.

Guerra de civilizações 17

Essa burca fica-te mesmo a matar.

Novo ciclo

'Tá-se bem em Belém.

Dilema

Há dias assim, em que tudo parece acontecer. O que fazer hoje, ao fim da tarde? Ir ao Centro Cultural de Belém para assistir ao lançamento do novo livro de Francisco Seixas da Costa? Ou ao Parque das Nações para dar um abraço ao Baptista-Bastos, que vai receber o Prémio João Carreira Bom? Ou ao Hotel Lutécia para ouvir a Helena Matos defender o aumento da licença de paternidade, na primeira das iniciativas mais visíveis do movimento de Manuel Alegre? Vida de jornalista também é feita de dilemas destes. Por vezes dá vontade de estar em vários sítios ao mesmo tempo.

domingo, março 26, 2006

Frases de filmes (4)

"Vou fazer-lhe uma oferta que ele não pode recusar."
Vito Corleone/Marlon Brando
em O Padrinho, de Francis Ford Coppola (1972)

Adeus, Manhattan

O GNT vai desaparecer do pacote da TV Cabo, apesar de figurar entre os dez canais mais vistos. Adeus Manhattan Connection, um dos programas televisivos de que mais gosto. É desta vez que vou ponderar a sério deixar de ser cliente da TV Cabo. Não têm vontade de fazer o mesmo?

Em defesa da Ordem

Emídio Rangel sai em defesa pública da Ordem dos Jornalistas. Alcides Vieira faz o mesmo. Miguel Sousa Tavares também. A ideia está a seguir o seu caminho. Apesar das vozes do costume.

Sugestão para o CDS ser um partido muito mais sexy (2)

Recrutar o deputado social-democrata madeirense Coito Pita.

Laura

Zapping nocturno. Fixo-me na RTP-2: lá está Gene Tierney, eternamente bela. Lá está Dana Andrews, galã de olhar errante, perdido nas malhas do cinema negro. É Laura: um dos melhores filmes de todos os tempos. Largo o telecomando. Uma vez mais, Laura hipnotiza-me até ao fim.
"Laura is the face in the misty lights / Footsteps that your hear down the hall / The love that floats on a summer night / That you can never quite recall // And you see Laura on a train that is passing through / Those eyes how familiar they seem / She gave your very first kiss to you / That was Laura but she's only a dream".

O dislate da semana

"É preciso tornar o CDS um partido sedutor, atractivo, sexy."
Pires de Lima, à saída do Conselho Nacional do CDS, 19 de Março

sábado, março 25, 2006

Sugestão para o CDS ser um partido muito mais sexy (1)

Convencer a Rachel Weisz a assinar a ficha de inscrição.

Agenda gastronómica

Ir a Penacova, à lampreia, com o João F e o Eduardo. Desafiar JP para um arroz de frango na Tia Matilde. Esperar que A me pague a aposta que me deve no Gambrinus. Jantar com o Luís no Solar dos Nunes. Matar saudades da empada de lebre no Coelho da Rocha.

As palavras dos outros

"Todo governo é um acto de depravação."
Millôr Fernandes

Dúvida existencial

Na sequência do anunciado fecho das maternidades, deixará de haver portugueses nascidos em Barcelos, Santo Tirso, Oliveira de Azeméis, Elvas, Amarante, Figueira da Foz, Mirandela, Bragança, Guarda, Covilhã e Castelo Branco?

sexta-feira, março 24, 2006

Frases de filmes (3)

"Mrs. Robinson! Está a tentar seduzir-me, não está?"
Ben Braddock/Dustin Hoffman
em A Primeira Noite, de Mike Nichols (1967)

Em nome da paridade

Proposta de revisão constitucional: a eleição do Presidente da República deve passar a submeter-se ao princípio da representação paritária. Na impossibilidade de eleição simultânea de dois titulares para a mais alta chefia do Estado, de sexos diferentes, este princípio concretizar-se-ia na eleição alternada, para mandatos consecutivos, de titulares previamente seleccionados em função do género. Agora foi eleito Cavaco. Daqui por cinco anos, se este princípio vingar, só poderá ser eleita uma mulher para Belém. Manuela Ferreira Leite, Ana Gomes, Maria José Nogueira Pinto, Odete Santos ou Joana Amaral Dias. É só escolher...

Dicionário de politiquês (XIII)

Carisma. Atributo inato e irrepetível que os analistas políticos de serviço reconhecem com frequência aos líderes que já foram e jamais reconhecem aos líderes que ainda estão.

O meu aplauso

À brilhante intervenção do constitucionalista Jónatas Machado, que num dos últimos Prós e Contras (RTP, 6 de Março) se pronunciou em termos inequívocos contra a recente intromissão do poder judicial na Redacção do jornal 24 Horas. "O sigilo profissional do jornalista tem como corolário lógico o sigilo da Redacção. A violação do sigilo da Redacção pode ser uma espécie de tortura institucional sobre um órgão de informação", salientou este professor de Coimbra. Sem papas na língua, Jónatas Machado considerou "rotundamente inconstitucional" a ofensiva em curso do Ministério Público contra o 24 Horas, já confirmada por um juiz de instrução. E alertou: "Os nossos tribunais estão sujeitos à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que já tem condenado o Estado português por violações à liberdade de imprensa. Se continuam esta prática, Portugal poderá vir a ser condenado mais vezes."
O meu aplauso redobrado por estas palavras de raro desassombro.

Revista de imprensa

Esta já vai atrasada, mas vale mais tarde que nunca. A melhor manchete da imprensa portuguesa em Fevereiro: "Águia voa com frango" (Record, 27 de Fevereiro), relativa à vitória do Benfica sobre o Porto, muito facilitada pelo guarda-redes Vítor Baía). Cinco estrelas! Parabéns à equipa dirigida pelo Alexandre Pais.

quinta-feira, março 23, 2006

Achei obsceno

Aquele brinde com champanhe feito por políticos socialistas e nacionalistas bascos mal a ETA anunciou um "cessar-fogo" que ninguém sabe se irá cumprir. É um insulto à memória das mais de 800 pessoas assassinadas pela organização terrorista.

Jornalismo, tendência Primavera/Verão

Sôtor, peço desculpa por lhe fazer esta pergunta.

A minha principal virtude é a modéstia

Ao contrário de outros políticos, eu tenho carácter. E sou fiel à palavra dada. E não perco a dignidade. E possuo sentido de Estado, com se vê pela minha pose inconfundível. E mantenho a coerência. E visto os melhores fatos. E até leio uns livros nas horas vagas, que agora são muitas. Sem querer ferir a minha própria modéstia, devo aliás confessar que sou o maior.

quarta-feira, março 22, 2006

O estado do Paulo (II)

A pedido de algumas famílias, seguem mais umas notas que tirei ontem durante a "aparição" televisiva de Paulo Portas na SIC/Notícias. Os temas são as directas no PSD, a situação (caótica) no CDS, as declarações de Durão Barroso sobre a invasão do Iraque e, por último, o Contrato Primeiro Emprego em França. Curioso que, afinal, Portas tenha deixado o registo politicamente certinho da primeira edição quase na mesma altura em que o seu antigo colega de Governo (e amigo recente desde aquela tomada de posse) Nuno Morais Sarmento combatia com unhas e dentes as directas no partido laranja.Mais uma preciosidade: ao contrário do que se disse por aí, Portas não criticou Barroso, apenas o enquadrou, digamos assim...

"Nunca quis instaurar um sistema de directas. Nisso sou um conservador"
"Nunca acreditei no dogma da multidão"
"Prefiro o sistema de eleição de líderes em congresso"
"Gosto de viver num sistema onde as instituições são fortes"
(sobre o PSD)

"Faço parte de um grupo parlamentar que é de todo o partido"
"O grupo parlamentar tem feito muitas vezes a melhor oposição na Assembleia da República"
"Não se envolvam em congressos extraordinários. Estou a citar-me a mim próprio"
"Cada um lidera como acha que o deve fazer"
(sobre o CDS)

"Faltou ao dr. Durão Barroso dizer mais algumas coisas: Portugal não participou na coligação militar, participou na coligação política"
"Não há ninguém como os americanos para fazer a guerra e não há ninguém como os europeus para manter a paz"
"Não há nada que os americanos façam sozinhos que não possam fazer melhor acompanhados"
(Sobre Durão e os americanos)

"Não recomendaria revoluções, muito menos em França"
"Os franceses têm esta predilecção para resolver os conflitos nas ruas"
(sobre o CPE)

Guerra de civilizações 16

Não ponhas tâmaras nessa salada de frutas.

Laços de ternura

Receba as flores que lhe dou / e em cada flor um beijo meu / são flores lindas que lhe dou / rosas vermelhas com amor / amor que por você nasceu. / E seja assim por toda vida / e a Deus mais nada pedirei. / Querida mil vezes querida / deusa na terra nascida / a namorada que sonhei. //
E no dia consagrado aos namorados / sairemos abraçados por aí a passear. / Um dia no futuro então casados / quase eternos namorados / flores lindas eu ainda vou lhe dar. //
E seja assim por toda vida / e a Deus mais nada pedirei."


Tema de Sidney Magal. Fica melhor cantarolado com sotaque brasileiro...

O estado do Paulo

"Os portugueses não almoçam directas nem jantam expulsões" - Paulo Portas, O Estado da Arte, SIC/Notícias

Paleio de empresário

Ó pá, que tal uma OPA?

Discutindo cinema

- Aquele filme Colisão fala de um choque frontal, de um choque lateral ou de um choque à retaguarda?
- Choque frontal, acho. Mas porque perguntas isso?
- Se for frontal vou ver. Para choques dos outros já me bastou aquele filme dos cobóis que foram buscar lã e saíram tosquiados.

A preto e branco

Muitos dos filmes da minha vida são a preto e branco. Manhattan, de Woody Allen. O Touro Enraivecido, de Martin Scorsese. A Lista de Schindler, de Steven Spielberg. E Casablanca, O Crepúsculo dos Deuses, O Mundo a Seus Pés, As Noites de Cabíria, O Sétimo Selo, Viagem a Itália, M, Viridiana, As Vinhas da Ira, O Tesouro da Sierra Madre, Breve Encontro, A Paixão de Joana d'Arc, Doutor Estranhoamor. Etc, etc. Hoje um filme a preto e branco é uma raridade. Este é também um dos motivos por que gostei tanto de Boa Noite e Boa Sorte.

terça-feira, março 21, 2006

Acríticos e baratinhos

Mike Wallace, o mítico jornalista da CBS norte-americana que deu rosto ao programa 60 Minutes, acaba de anunciar a retirada do serviço activo. Motivo: está prestes a completar 88 anos. “A minha vista e a minha audição já não são o que eram”, justificou Wallace, que popularizou a seguinte máxima profissional: “Não há pergunta que não possa ser feita.” E ele fez muitas, até ao aiatola Komeini, a quem chegou a perguntar se era lunático.
Mesmo em situação de reforma, Wallace manter-se-á nos quadros da CBS como “correspondente emérito”. Sorte dele. Se vivesse em Portugal, teria provavelmente sido forçado há cerca de quatro décadas a abandonar a profissão. A experiência e a memória, em muitas das nossas redacções, são olhadas com crescente suspeição. O que está a dar é a mão-de-obra fresca e verde. Acrítica e baratinha, de preferência. Muito baratinha.

A blasfémia do dia (XIX)

- Que versículos leste hoje?
- Os Versículos Satânicos.

A culpa não está nas estrelas


É um dos grandes filmes "políticos" dos últimos anos. E tem como elemento-chave uma das melhores frases de todos os tempos. Uma frase extraída da peça Júlio César (acto I, 2ª cena), de Shakespeare: “A culpa, caro Bruto, não está nas nossas estrelas, está dentro de nós.” As estrelas, de facto, não têm culpa...

As palavras dos outros

"O ideal seria não haver limites para nenhum tipo de criatividade. Mas já existem limites para a expressão livre, nas leis contra calúnia e difamação. O que acontece agora é que o medo de sofrer um processo evoluiu para o medo de ser decapitado."
(Luís Fernando Veríssimo, entrevista à Sábado, 16 de Março)

Cultura, enfim

Lisboa tem sido por estes dias uma cidade privilegiada para os amantes da cultura. Exposição de Frida Khalo no Centro Cultural de Belém. Reabertura da galeria do DN, com quadros da colecção Berardo - incluindo telas de Warhol e Lichtenstein. Reabertura do Teatro Maria Matos, com uma boa programação. A Gaivota, de Tchekov, prestes a estrear na Cornucópia com tradução de Fiama Hasse Pais Brandão. A excelente Ópera do Malandro, de Chico Buarque, que electrizou o Coliseu e agora vai para o Porto. Nos cinemas, Match Point (de Woody Allen), Uma História de Violência (David Cronenberg), Munique (Steven Spielberg), O Fiel Jardineiro (Fernando Meirelles), Colisão (Paul Higgis). E essa obra-prima absoluta da Sétima Arte que é O Leopardo, de Visconti - a ver ou rever com o deslumbramento de sempre no Nimas. Por uma vez, podemos estar satisfeitos: eis uma oferta cultural digna de uma capital europeia.

segunda-feira, março 20, 2006

Guerra de civilizações 15

- Tens aí uma tesoura para cortarmos esta fita?
- Nada de tesouras. Corto sempre as fitas com uma adaga.

Dicionário de politiquês (XII)

OPA. Sigla importada do tecnocratês. É o que Belém se prepara para fazer a São Bento no próximo quinquénio.

Também há rapazes maus


Tsotsi é um filme sul-africano que chegou a Portugal aureolado com um Óscar. Refiro-me ao Óscar para melhor filme estrangeiro, que em anos anteriores agraciou obras de Fellini e Bergman. São tempos que já lá vão: hoje esta estatueta não premeia a qualidade artística mas a correcção política. Tsotsi é um bom exemplo disso: a sua ténue linha ficcional gira em torno de um preto pobre, que segue os trilhos do crime por ser vítima de uma sociedade assimétrica. Mata, rouba, estropia – mas no fundo é um bom sujeito. Basta um pouco de atenção, um nada de carinho para o implacável criminoso se transformar num bebé chorão.
Não há verosimilhança que resista a esta sociologia de pacotilha. Tsotsi procura imitar Cidade de Deus, mas na obra-prima de Fernando Meirelles os garotos de rua eram retratados com uma implacável autenticidade: nenhum mau da fita surgia travestido de menino de coro. Hollywood, como o Padre Américo, não acredita na existência de rapazes maus. Pero que los hay, los hay. E em nada se assemelham ao que este filme mostra.
As grandes obras de arte não se fazem com bons sentimentos. Tsotsi fica-se pelos bons sentimentos. Não tem mais nada para dar.

Caras e coroas

A inacção de Jorge Sampaio em Belém, durante uns intermináveis dez anos, fez mais pela popularidade da monarquia em Portugal do que todas as proclamações de D. Duarte Pio e do seu pitoresco grupo de amigos.

Vida partidária

Eles odeiam-se. Em privado, não perdem uma oportunidade para dizerem cobras e lagartos um do outro. No partido, todos sabem disto. Mas em público, neste congresso do PSD, dialogaram amenamente, sorriram, abraçaram-se para as televisões mostrarem. Se os portugueses viram costas à política, também é por coisas destas.

Crise francesa e crise europeia (I)

Inspirados nos incidentes que têm abalado a França, muitos comentadores referiram, sobretudo nos jornais, que a crise francesa corresponde a um impasse que ameaça paralisar a Europa. Discordo desta visão pessimista.
A França está em transição e a sua situação política só ficará clarificada em meados do próximo ano, depois das eleições presidenciais. Nicolas Sarkozy, um populista de direita é a figura em melhor posição para vencer essas eleições. Se a direita vencer, as reformas económicas serão inevitáveis, apesar da tradição de contestação na rua. Sobre este ponto, vale a pena lembrar que estamos a falar de um país com opinião pública muito politizada. Nos últimos dois séculos, com ciclos quase simétricos a rondar 30 anos, houve períodos de choque externo seguidos de mudança acelerada, culminando em reforço da autoridade central do Estado: Maio de 68, Frente Popular, Comuna de Paris, Revolução Liberal, para citar apenas exemplos de reacções epidérmicas da sociedade francesa a grandes alterações que estavam a ocorrer no mundo e na economia.
A França enfrenta uma mudança económica que está a questionar o confortável modelo social construído nos últimos 50 anos. É evidente que os economistas e os sociólogos sabem isso muito bem e há reformas em curso, mesmo se os Governos as fazem cada vez mais discretamente. Além disso, não está provado que certos elementos do modelo social que desaparece não possam sobreviver. Falo dos elementos centrais, como serviços públicos eficazes, protecção no desemprego e na velhice, educação e justiça para todos ou segurança no emprego.

Crise francesa e crise europeia (II)

Neste conflito é a segurança no emprego que está em causa. Este foi um dos argumentos mais importantes no debate sobre a Constituição Europeia, que o eleitorado francês rejeitou por temer o chamado “canalizador polaco”, referência a uma directiva europeia que teria consentido a empresas polacas operarem em território francês sob regulamentação polaca, o que os franceses viram como uma ameaça aos padrões elevados do seu mercado.
Acho que os comentadores liberais sobrevalorizam a importância do argumento segundo o qual leis de emprego precário aumentam o número de pessoas empregadas. Sim, mas criam empregos de má qualidade e mal pagos. Quando os serviços públicos se degradam e diminui a protecção no desemprego, a maioria das pessoas vê na precarização uma promessa de empobrecimento. E o que tem a perder uma pessoa que protesta nas ruas contra uma iniciativa que a vai prejudicar?
Também se diz que os avanços na Europa estão comprometidos. Discordo fortemente que a crise francesa seja uma crise europeia. Pelo contrário. Quem impede a Irlanda ou a Finlândia de terem robustez económica? Irlanda ou Estónia são livres de não adoptar o modelo francês. Além disso, não existe harmonização social ou fiscal na UE, portanto o facto de haver países que introduzem reformas eficazes torna-se mais uma razão para outros Estados tentarem adoptar medidas semelhantes ou, no mínimo, estudarem o assunto. A Europa é suficientemente flexível para permitir experiências distintas. A França, estando integrada num conjunto onde existe um arco de países com grande pujança, estará obrigada a fazer as reformas que considerar necessárias, mas numa dose que ninguém lhe pode impor.

domingo, março 19, 2006

Evolução das espécies

Em Espanha, há três décadas, os jovens lutavam pelo direito à liberdade. Agora lutam pelo direito ao garrafão. Darwin tinha razão. Ou talvez não.

Frases de filmes (2)


"O amor! Fogo durante um ano, cinzas durante trinta..."
D. Fabrizio, Príncipe de Salina/Burt Lancaster
em O Leopardo, de Luchino Visconti (1963)

Clareza política

O Martim já escreveu (bem) sobre o assunto no Mau Tempo no Canil. Mas não é de mais voltar ao tema. Devia Cavaco Silva ter convidado um representante do PCP a integrar o Conselho de Estado? Só por hipocrisia política esse convite seria feito. E só por hipocrisia política seria aceite. Evitemos equívocos. Falta clareza na nossa vida política: se os comunistas não acham o novo chefe de Estado sequer digno de aplauso protocolar no momento em que toma posse (e o artigo de Vítor Dias no Público de sábado ajuda a explicar porquê), o que os leva agora a reivindicar um convite de um presidente que não elegeram e a quem atribuíram a pior das famas durante a recente campanha eleitoral?

O dislate da semana

"Acho que era o engenheiro Sócrates quem dizia ser um animal feroz. Pois vamos também nós [PSD] ser ferozes. Vai passar a ser um zoo, isto."
(Alberto João Jardim no congresso do PSD, 18 de Março)

Um criminoso à nossa espera

Vivi uns anos no Rio de Janeiro e voltei a Lisboa em 1985. Já na altura éramos recebidos por criminosos no Aeroporto, que nos queriam extorquir no taxímetro, ou nos ameaçavam, ou nos insultavam por não sermos turistas estrangeiros e não irmos até um hotel em Cascais onde lhe pagariamos a fortuna que mereciam. Hoje, 21 anos passados, continuamos a ser recebidos por criminosos no Aeroporto, apesar de um ou outro ser ocasionalmente preso. Entretanto, passaram presidentes da república a falar de turismo de qualidade, governos a falar de turismo de qualidade, ministros a falar de turismo de qualidade, presidentes de Câmara a falar de turismo de qualidade, autoridades policiais e de todo o tipo a garantir que vivemos num país civilizado. Ninguém faz nada que resolva um problema que está à vista de todos e alguns até o acham compreensível, com uma certa atitude Robin Hood perante os estrangeiros endinheirados que nos visitam. Eu, depois de ter quase chegado às vias de facto com dois ou três desses criminosos, resolvi a questão indo sempre apanhar táxi às Partidas. Nunca mais tive um único problema. Mas uma sociedade que, ao longo de mais de 20 anos, não consegue encontrar solução para uma coisa tão prosaica e consensual como esta não pode ser capaz de vencer qualquer "desafio".

sábado, março 18, 2006

Os contemporâneos


Centenas de jovens estudantes franceses que o ministro do Interior classificou de anarquistas só interessados em bater-se nas ruas ou hooligans sem outro interesse além da violência envolveram-se em incidentes com a polícia nas proximidades de um dos santuários do saber na Europa, a Sorbonne. Estes casseurs são da classe média e vivem numa das sociedades mais livres e prósperas do mundo. Alguns deles serão a futura elite da França. Verdadeiros privilegiados, afinal, com acesso a educação de primeira qualidade.
Em Granada, 20 mil jovens, aparentemente de todas as classes sociais, participaram num chamado “Botellón”, uma bebedeira colectiva em protesto contra restrições à venda de álcool a menores de idade. Houve manifestações semelhantes em várias cidades de Espanha, convocadas por sms. A Espanha tem uma das economias mais dinâmicas da Europa e é um dos países mais ricos do mundo. Estas pessoas parecem não encontrar melhores motivos para exercerem a sua indignação.
Cerca de 750 jovens americanos combatem há três dias numa cidade a norte de Bagdad. A batalha de Samarra é uma das mais violentas em três anos de um conflito que já matou o mínimo de 30 mil iraquianos (há quem fale em 100 mil), 2200 americanos e mais de cem ingleses. Cerca de 140 mil soldados americanos servem de alvo à insurreição no Iraque. Alguns não voltarão para casa. São todos muito jovens e, se não estivessem a defender o Império, estariam a enfrascar-se na sua cidade natal ou a protestar nas imediações de uma universidade. Ou, pura e simplesmente, não teriam nenhum motivo para se indignarem.
Falando em nihilismo contemporâneo, parece-me que estas três histórias não estão relacionadas. Mas, se estão, não imagino qual seja a moral da história.

Hino da Repressão

Se atiras mendigos
No imundo xadrez
Com teus inimigos
E amigos, talvez
A lei tem motivos
Pra te confinar
Nas grades do teu próprio lar

Se no teu distrito
Tem farta sessão
De afogamento, chicote
Garrote, punção
A lei tem caprichos
O que hoje é banal
Um dia vai dar no jornal

E se definitivamente a sociedade
Só te tem desprezo e horror,
E mesmo nas galeras és nocivo,
És um estorvo, és um tumor
Que Deus te proteja
És preso comum
Na cela faltava esse um!


Escrito por Chico Buarque em 1978 para a excelente Ópera do Malandro, que esta semana regressou aos palcos portugueses com uma produção de cinco estrelas. Espantosa a crueza da letra, redigida numa altura em que estava no auge a ditadura militar brasileira.

Frases de filmes (1)


"Um mundo capaz de produzir o Taj Mahal, William Shakespeare e a pasta de dentes às riscas não pode ser mau de todo."
MacNamara/James Cagney
em Um, Dois, Três, de Billy Wilder (1961)

Perguntar não ofende

20h30 de ontem, início do congresso do PSD. Uma das principais rádios portuguesas, em directo do Parque das Nações, pergunta a Paula Teixeira da Cruz, actual número dois do partido:
- Marques Mendes vai sair bem?
Resposta (óbvia) da vice-presidente social-democrata:
- Marques Mendes vai sair forçosamente bem.
Assim vai o jornalismo em Portugal: perguntas dóceis e delicadas, não vá algum político ofender-se...

sexta-feira, março 17, 2006

A crítica e o resto (1)

O Luís Naves tocou ontem aqui num ponto muito importante: os critérios "editoriais" da crítica portuguesa, designadamente a crítica literária. Acabou um tempo em que o crítico se propunha ter uma visão global do mundo literário. Hoje é-se crítico como quem produz comentários em vários canais de TV: com o emblema do partido na lapela ou o cachecol do clube ao pescoço. Só quem integra a tribo merece ser mencionado. Estratégias de grupo, cumplicidades ideológicas, afinidades demasiado evidentes com certas empresas editoriais são factores que chegam e sobram, em muitos casos, para entendermos o silêncio a que são votadas certas obras, em contraste com o alarido dedicado a outras.

A crítica e o resto (2)

Há também, como referia o Luís, o chamado critério do "gosto" dominante. É um critério que qualifica a arte de acordo com os critérios em voga nas competições desportivas. Diz-se, por exemplo, que "Herberto Helder é melhor do que Manuel Alegre", como se estivéssemos perante uma evidência universal, comprovada por cálculo matemático. Ou que o neo-realismo, tal como o marxismo, foi atirado para o caixote de lixo da História. Sem mais. Não há um esforço de análise, não há uma tentativa séria de ler um texto em função do seu mérito específico mas de acordo com o rótulo mais à mão. A crítica reduz-se assim a uma máquina de triturar nomes e tendências. Tantas vezes em nome de meras estratégias de marketing editorial.

A crítica e o resto (3)

Antes, na dúvida, lia-se. Agora, na dúvida, ignora-se. O livro não chega a abrir-se, o filme não chega a ser visto. É o novo modo de aniquilar um autor: fingir que ele nem sequer existe. Algumas das películas mais interessantes que estrearam no ano passado entre nós foram total ou parcialmente ignoradas pela crítica cinematográfica. Incluindo Colisão, o filme que acaba de ser galardoado com o Óscar de Hollywood - vários críticos cá do burgo nem se deram ao trabalho de o espreitar numa sala. O mesmo se passou, no campo literário, com o último volume de contos de Rui Zink, intitulado A Palavra Mágica - uma das mais estimulantes obras de ficção lançadas em Portugal em 2005, acolhida com um pesado silêncio crítico enquanto havia quem gabasse nulidades literárias como Jardim Colonial, de José António Saraiva. Uma inversão de valores que me faz lembrar aquele juízo crítico formulado por um escriba americano quando Walt Whitman lançou Leaves of Grass, em 1855. "Uma massa imunda de estupidez", bolsou o escriba. Sem reparar que estava afinal a ver-se ao espelho.

Atento

Vou estar atento à reunião magna que se realiza esta noite no Parque das Nações. Refiro-me, claro está, à assembleia-geral do Sporting.

Vicente no seu melhor

Sobre a inquietante relação actual entre o Governo e os órgãos de informação, é imprescindível ler um excelente artigo de Vicente Jorge Silva. Aqui.

Fogo de artifício


Num excelente artigo da revista Time sobre as inovações em Hollywood e a adopção do digital, o autor, Richard Corliss, escreve a páginas tantas que “no novo mundo digital, a forma está a definir o conteúdo”. Corliss refere-se ao fascínio que os cineastas têm em relação às possibilidades oferecidas pela tecnologia, fenómeno que, na sua opinião, está a ditar que histórias são contadas. A observação parece ser ainda mais interessante por se aplicar a outras actividades, da literatura à política, passando pelo jornalismo e a blogosfera. O primado da forma é muito evidente na política contemporânea, por exemplo, onde o que diz um candidato ou um eleito deixou de ser menos importante do que a ênfase e a convicção, o aspecto exterior do político ou a compreensão que a maioria das pessoas tem daquilo que é dito. A arte também entrou numa lógica de experiência obrigatória, onde a obra só tem valor se encontrar a forma inovadora. No cinema americano, o excesso de tecnologia está a colocar o trabalho dos actores num plano secundário (não falo das vedetas de plástico que são iguais em todos os filmes). É por isso que acho haver tantas semelhanças entre o mundo contemporâneo e o barroco, com a supremacia da forma e o triunfo do espectáculo. Os grandes filmes de Hollywood são proezas técnicas com muito fogo de artifício e invenção visual, mas conteúdo pobre. Como a ópera no tempo de Luís XIV.

quinta-feira, março 16, 2006

"Paridade" socialista

Há só duas mulheres no elenco ministerial de Sócrates. O grupo parlamentar do PS, campeão da paridade, não acha pouco.

Parem as máquinas

Marcelo Rebelo de Sousa em rigoroso exclusivo: "Mesmo que Maomé desça à Terra prometo não disputar a liderança do PSD antes de 2008." Reacção de Freitas do Amaral: "É uma declaração de conteúdo licencioso, que fere os sentimentos religiosos do mundo islâmico, justifica possíveis erupções de violência e merece o mais vivo repúdio do Governo português."

Guerra de civilizações 14

Damasco? Dá-me asco.

Crítica da crítica

Queria pegar numa deixa do Pedro Correia, em posta anterior, sobre “o regresso do realismo social”. Não vi o filme “Terra Fria” e, portanto, não estou aqui a falar desse filme, nem apenas do cinema. A posta do Pedro inclui uma crítica aos críticos, por estes terem ignorado “Terra Fria”. Na minha opinião, a frase toca num problema central: o desinteresse da crítica portuguesa em relação a uma das vertentes mais importantes da narrativa contemporânea, desinteresse esse que revela um determinado gosto. Atrevo-me até a falar em “gosto da moda”. Quando alguém conta uma história, seja em literatura, teatro ou cinema, tem duas opções genéricas, ou escolhe desenvolver o mundo interior das suas personagens ou o efeito que o mundo exterior tem nas suas personagens. Dito de outra maneira, pode optar entre a intimidade e a sociedade. Claro que os génios conseguem misturar os dois elementos, mas é difícil. Dois excelentes escritores, como Lobo Antunes ou Saramago, são distintos na dose que concedem a cada uma das duas vertentes. Ora, a moda dominante da crítica parece incomodada quando depara com histórias que optaram pelo realismo e por alguma dose de análise social. Acho evidente que uma escolha nunca é superior à outra, mas a crítica valoriza em excesso a intimidade, tornando quase invisível a sociedade. Como se o mundo em que vivemos não tivesse problemas sociais e o exercício de os discutir fosse tarefa indigna dos artistas, lá na sua torre de cristal.

quarta-feira, março 15, 2006

Gostei



De ver Terra Fria, um filme da neozelandesa Niki Caro. Aplaudo sem reservas: o realismo social regressa enfim ao cinema americano, que tem andado rendido à logica do "entertenimento". Com uma história densa, bem escrita, cheia de tensão dramática e que nos fornece muitas pistas de reflexão. Charlize Theron - muito mais do que uma cara bonita - dá-nos aqui uma espantosa lição da arte de representar. Sintomaticamente, dois dos quatro críticos de cinema do Público nem se deram ao incómodo de ver o filme. Isto de distribuir estrelas dá muito trabalho...

Dicionário de politiquês (XI)

Coabitação. Concubinato de forças políticas de aparente sinal contrário com vista à futura permuta de contratos de arrendamento entre os inquilinos dos palácios de Belém e de São Bento.

Parada de ministros

Jornal 2, ontem à noite. 22 horas: logo a abrir, surge o ministro da Saúde, Correia de Campos. Fala com ar enérgico. Este homem "não perdeu tempo", garante uma voz off. 22h06: a imagem mostra o ministro da Administração Interna, António Costa, assegurando com firmeza ser "completamente indiferente" a manifestações de protesto. 22h09: aparece no ecrã o ministro da Agricultura, Jaime Silva, rebatendo com autoridade algumas críticas que lhe foram dirigidas. 22h10: é a vez do ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, que fala com pose de estadista em Bruxelas, onde participa numa reunião europeia. Por parte da oposição, certamente por coincidência, nem um pio. O Jornal 2 é apontado por alguns comentadores como um exemplo de bom jornalismo televisivo. E com toda a razão: exibir quatro ministros em dez minutos é um verdadeiro serviço público.

O tratado (I)

Na blogoesfera e nos jornais, tem sido pobre o debate sobre o Tratado Constitucional europeu e o futuro da União Europeia. Das duas uma: é como se não dissesse respeito ao País ou fosse problema dessa mítica e perigosa entidade, Bruxelas. As poucas reacções que tenho lido são invariavelmente de irritação pelas propostas de reanimar o falecido tratado. Penso que as críticas são tiros fora do alvo e permita-me o leitor o atrevimento de tentar discutir algo que me parece mais importante. O tratado não passa do instrumento que permitirá determinadas políticas. As duas últimas partes, por exemplo, que causaram grande perplexidade, nada têm de novo e são apenas a amálgama simplificada de artigos de anteriores tratados. A segunda parte do texto visa garantir que a UE, nas suas decisões, não viole aqueles direitos dos cidadãos. O essencial está na primeira parte, onde alguns artigos novos vão permitir avançar com certas políticas. Sem o novo desenho institucional, a UE não poderá aumentar o número dos seus membros. Há países que, num prazo de dez a vinte anos, vão provavelmente aderir ao grupo, tais como a Turquia, a Noruega, a Croácia, a Islândia, entre outros. O total final estará talvez entre 30 a 35. Penso que ninguém estará demasiado preocupado com o Presidente do Conselho ou o número de comissários, mas toda a gente percebe que é necessário adaptar as instituições. Isso pode ser feito através da revisão relativamente modesta dos actuais tratados, seguida de ratificação parlamentar pacífica. Ou seja, aquilo que é verdadeiramente importante está noutro sítio.

O tratado (II)

A UE confronta-se com vários problemas práticos. É um gigante económico, com poder de influenciar a evolução em muitos países do mundo, mas continua um anão político; ficou famoso o caso do aeroporto palestiniano que os europeus pagaram e o Presidente americano inaugurou para a CNN. Além disso, a Europa é um espaço de livre circulação de pessoas, bens e capitais, tendo aprendido da forma mais difícil que esse princípio é incompatível com a existência de 25 políticas de justiça, outra tantas de energia ou de imigração, 25 forças armadas a consumirem recursos sem eficácia, 25 formas de combater o terrorismo. Em Portugal, quando se fala em políticas comuns nestas áreas, surgem argumentos extraordinários, nomeadamente de que isto é contra os Estados Unidos ou que também não temos políticas antiterroristas comuns com a Austrália (confusão com Áustria, que partilha com Portugal um espaço de livre circulação). Sobretudo, é visível que a cooperação entre países já não chega em nenhuma destas áreas, pelo que os tratados terão de ser alterados para permitirem avanços colectivos. Sem mudanças, estaremos indefesos na luta contra grupos terroristas que se movem no espaço europeu. Se nada for feito na defesa, por exemplo, a UE continuará a ser um anão político e não vejo qual seja a vantagem disso. Claro que a defesa comum não visa criar um desafio estratégico aos Estados Unidos, pela simples razão de isso não ser possível ou desejável (seria também demasiado caro). Acima de tudo, o reforço da segurança do seu aliado mais relevante constitui uma óbvia vantagem para Washington.

terça-feira, março 14, 2006

Uma fraude em forma de filme

Fui ver um filme chamado Syriana. Uma pretensa análise sobre o mundo pós-11 de Setembro, centrada no atribulado labirinto do Médio Oriente. Com os maus do costume: os americanos em geral e os negociantes de petróleo em particular. A habitual história da carochinha, agravada pelo tom pedante e conselheiral da fita, protagonizada por um George Clooney irreconhecível. Há também os bons, claro: são os árabes moderados e reformistas, que acabam liquidados pela camarilha ianque, apostada em perpetuar sine die a cascata da corrupção. Dos israelitas ninguém fala, nem bem nem mal: atitude prudente, não fossem os financiadores judeus da indústria cinematográfica americana fechar a torneira dos dólares.
Syriana indigna-se. Mas é uma indignação selectiva, ardilosa, fraudulenta. Uma mistificação, portanto. Fica o aviso aos incautos: em matéria de demagogia primária travestida de cinema, Michael Moore faz bem melhor. E com a vantagem de gastar menos película: Syriana, monumental chumbada, tem quase três horas de duração. Acreditem em mim: é melhor passar ao largo.

Pacem in Terris

- Senhor ministro, como analisa a explosiva situação internacional?
- Somos todos filhos de Abraão. Ossama bin Laden não é excepção.

Uma autora: Maria Manuel Viana

Alguns livros caem nas graças dos media; outros, por motivos misteriosos, não têm a visibilidade que merecem. O segundo caso aplica-se ao excelente romance de Maria Manuel Viana, "A Dupla Vida de Maria João” (Editorial Teorema, 158 páginas). Trata-se de um texto poderoso e surpreendente que merece leitura atenta, mas cuja publicação passou relativamente despercebida. Escrito em linguagem torrencial, mas ao mesmo tempo simples, o livro conta a história de uma professora com personalidade fragmentada, que se anula perante as suas dificuldades amorosas, num instinto de protecção face ao mundo exterior. A autora consegue revelar um universo íntimo repleto de sonho e crueldade. Mas este é também o universo poético, onde se desenha um fio de pequenas histórias, com momentos de impacto visual e óbvio virtuosismo estilístico. Enfim, “A Dupla Vida de Maria João” é um livro muitíssimo bem escrito e, ao contrário da sua personagem principal, Maria Manuel Viana revela forte personalidade como escritora. Sem dúvida, um nome a reter por quem gosta de literatura.

A diferença entre o talento e o génio

Por uma vez, a Academia de Hollywood acertou. Colisão é uma obra-prima. O Segredo de Brokeback Mountain é só um filme bonitinho e condimentadinho de piedosos sentimentos. No fundo, estamos perante a diferença entre o simples talento e o rasgo de génio.

segunda-feira, março 13, 2006

A blasfémia do dia (XVIII)

Ir a Meca? Nem de maca.

Assim vai a República



Os príncipes de Espanha, Letizia e Felipe, foram as personalidades mais aplaudidas em Lisboa no dia da posse de Cavaco.

A fraqueza da França

Não compreendo a satisfação que se percebe em alguns textos escritos por analistas de direita sobre as constantes crises da França. Talvez a espinha iraquiana esteja tão atravessada em certas gargantas que se perde a visão do essencial. A contestação ao Governo por causa do contrato de primeiro emprego vem dos sectores mais conservadores da esquerda francesa. Se essa contestação se intensificar, a direita reformista será afastada do poder, com duas hipóteses principais: a vitória da esquerda anti-globalização e defensora de um modelo para a Europa que não funciona; em alternativa, (cenário pesadelo e felizmente pouco provável) o acesso da extrema-direita ou da direita populista ao poder. Em qualquer dos casos, os países mais importantes da União Europeia vão atrasar a introdução de reformas económicas que os liberais consideram urgentes. Haverá ainda mais a distinção entre o arco de países com economia modernizada e o núcleo preocupado em preservar um determinado modelo social e que parece não conseguir sair do ciclo de declínio. Acho que a maioria dos analistas esquece que uma França enfraquecida implica uma Europa fraca. Claro que parte da direita portuguesa é contra a ideia de Europa, mas essa é outra conversa.

Obra de arte

O golo de Tonel em Alvalade.

A crónica perfeita

Existe a crónica perfeita? É espécie rara, mas existe. A de João Bénard da Costa no Público de ontem.

Líder, mas pouco

Eu não sou o chefe da banda

domingo, março 12, 2006

Grande Berlusconi

Não acompanho a política italiana e, provavelmente, se vivesse em Itália não votaria nele, mas a verdade é que tenho grande simpatia por Sílvio Berlusconi. Sobretudo pela sua capacidade de resistir aos bens pensantes, aos jornalistas, àqueles que o odeiam só por ser rico e bem sucedido. Gosto destas pessoas contra tudo o que os outros gostariam que eles fossem. O saudoso Boris Ieltsin era assim, sempre nas tintas para os editoriais indignados, os esquerdistas ressentidos, os "rebeldes" da normalidade. E ainda por cima tinha a qualidade de beber quando muito bem lhe apetecia, O gesto de Berlusconi de abandonar a entrevista é magnífico. Não percebi porquê, porque os telejornais portugueses, como seria de prever, enquadraram a coisa de maneira a que a entrevistadora parecesse uma vítima do "Berlusconi de sempre" (legenda da Sic). Mas gostei muito de ver que ainda há políticos capazes de gestos que sabem que vão ser condenados pelos "media" de todo o mundo.

A cores


Quando estivermos mais à vontade com a forma como se põe imagens no blogue, vai ser mais ou menos assim...

O homem que corta a direito

Falo de Paulo Bento. O treinador do Sporting continua a surpreender, com mais uma vitória, desta feita frente ao Boavista (1-0 e aquele golão do Tonel), ontem à noite. O SCP da era Bento está a milhas do que se passava no tempo de José Peseiro. Há ordem no balneário (lembre-se o "caso de estalada" entre Beto e Custódio, as birras sucessivas de Liedson, Rochemback e Polga ou o afastamento sumário de Ricardo da baliza), disciplina em jogo, a equipa joga futebol que se veja e os adeptos rejubilam. As vitórias sucedem-se. As contratações de Inverno funcionam, os jovens promovidos jogam que se desunham (até os descobertos por Peseiro, como Moutinho, estão melhor enquadrados) e a lista de dispensas foi muito bem feita. Posto isto, o homem ameaça tornar-se num caso sério caso chegue ao título, depois de no ano passado ter ganho pelos juniores. Não digo que venha a ser um novo Mourinho, sobretudo porque já há tantos aspirantes à categoria, mas pode traçar um caminho próprio muito interessante. No Sporting. Para mim, até agora (e já esqueci os empates iniciais) só tenho uma coisa a apontar: Aquele risco ao meio de se fugir não fica bem a um treinador de um clube como o Sporting. Mas quem já teve Manuel Fernandes não se pode preocupar com isso, enquanto a tabela mostrar o SCP lá bem em cima...

Um dos últimos boémios de Lisboa

Morreu Sérgio de Azevedo, um dos homens que melhor conhecia os bastidores do teatro em Portugal. Parece que ainda estou a vê-lo, já madrugada, na eterna mesa do Pedro V, desfiando saborosíssimas histórias protagonizadas por actrizes e actores que conheceu muito bem e cujas carreiras em vários casos lançou. Era, mesmo à beira do fim, um homem ainda cheio de planos. E conseguiu concretizar um deles: a produção da peça Esta Noite Choveu Prata, que trouxe de novo aos palcos o grande Nicolau Breyner, um amigo de sempre. Era um dos últimos boémios à moda antiga, desses que tratavam por tu as noites de Lisboa. Parece que ainda o ouço soltar uma daquelas sonoras gargalhadas, entre o bife e o uisquinho, no bar que tantas vezes lhe servia de poiso para fintar a solidão. À sua maneira, acabou por dar uma imensa lição de vida a todos quantos, como eu, tiveram o privilégio de o conhecer.

O dislate da semana

"Freitas do Amaral evoluiu claramente para a esquerda, mas mantém uma coerência irrepreensível (...). Qualquer governo se pode orgulhar da presença de um ministro desta qualidade."
Eduardo Prado Coelho, Público, 7 de Março

Nós e os outros

1. Informa-me o sitemeter que já começámos a cortar fitas em vários países. Temos leitores regulares em Espanha, França, Inglaterra, Holanda, Cabo Verde, Brasil, EUA, Índia e China. Isto de estar em rede é mesmo uma aventura sem fronteiras. Abraços para os amigos aí em Leeds, Salamanca, Ile de France, Cidade Velha, Califórnia, São Paulo, Nova Deli e Macau!
2. Anoto as amáveis referências que nos fizeram nestes dias vários confrades da blogosfera, incluindo o Nada Te Turbe, o Torriano, o Posto de Escuta e a Revisão da Matéria. Também por cá se vai lendo com atenção o que aí se escreve.
3. Helena Matos passou a integrar a dinâmica equipa do Blasfémias. Vou lê-la com a atenção de sempre.
4. Inconsoláveis ficámos todos nós com a partida de Constança Cunha e Sá e Vasco Pulido Valente. Sem o Espectro, a blogosfera não será a mesma. Voltem sempre!

sábado, março 11, 2006

Os "neo-cavaquistas"

Curiosa a prestação de ontem de Nuno Morais Sarmento (PSD) e de António Pires de Lima (CDS) no programa Expresso da Meia-Noite na SIC-Notícias. Fez-me lembrar o que disse o primeiro numa célebre entrevista ao Diário Económico (já perto do período de pré-campanha) e o que fez o segundo para que surgisse uma alternativa a Cavaco Silva de dentro do CDS. Alternativa essa que, sabe-se hoje, poderia ter deitado por terra a eleição à primeira volta de Cavaco. Isto para além da reacção colérica que teve quando soube que o então candidato se esquecia de referir o nome do seu partido nos comícios de campanha. Das duas uma: Ou a opinião político-partidária nunca foi tão descartável em Portugal ou estamos perante os mais recentes membros do cavaquismo. Chegou, portanto, o neo-cavaquismo...

A profissão de político

Já aqui referi a questão da qualidade da democracia como argumento que justifica não se avançar com quotas de mulheres nas listas para deputados. Além disso, o Parlamento não tem de ser o espelho exacto da sociedade, com proporções milimetricamente idênticas, e em todas as categorias, às do País. Mas, neste debate, é como se a profissão de político fosse separada da realidade. Toda a gente acharia absurda uma lei que impusesse quotas às empresas, às restantes profissões, às escolas. Um mínimo de 33% de estudantes de filosofia do sexo feminino, 33% de jornalistas nas redacções dos jornais, 33% de médicas em Santa Maria. As mulheres estão a conquistar lugares nas diferentes profissões pelo seu mérito e este é um processo irreversível. Só precisam de leis que impeçam a sua discriminação, não entra por ser mulher. Se recuarmos duas gerações, não havia mulheres em orquestras sinfónicas ou no exército, por causa de preconceitos da época. Solistas de concerto ou oficiais em postos de comando eram raridades há vinte anos. Hoje, são ainda raras as maestrinas ou coronéis, mas há mulheres talentosas que vão acabar com os tabus.

Insónia

Ligo o televisor de madrugada, ouço Pacheco Pereira bradar contra as quotas sexuais na vida política. Este homem nunca se cala? - interrogo-me, estremunhado. Afinal (percebo melhor, já um pouco mais desperto) é uma gravação que a SIC-Notícias põe no ar em sessões contínuas. À mesa com Pacheco está Jorge Coelho, que diz: "Há mulheres com qualidade e mulheres sem qualidade, tal como há homens com qualidade e homens sem qualidade."
Desligo o aparelho, adormeço logo a seguir.

sexta-feira, março 10, 2006

Dicionário de politiquês (X)

Governabilidade. Habilidade para governar. Jorge Sampaio, por exemplo, considerou que Santana Lopes tinha governabilidade ao dar-lhe posse em Julho de 2004.

Guerra de civilizações 13

O problema do Irão é ter falta de Xá.

Descubra as diferenças

Ontem: o presidente de todos os portugueses. Hoje: o presidente de Portugal inteiro.

Não vão domesticar-nos (2)

A liberdade de imprensa, consagrada no artigo 38º da Constituição da República, é um dos pilares do regime democrático. Mas esta liberdade não existe sem a protecção das fontes, garantida pelo segredo profissional dos jornalistas – garantia que algumas autoridades judiciais ameaçam agora pôr em causa. Perante o silêncio cúmplice do poder político. Nenhum jornalista pode tolerar isto. Hoje acontece com o 24 Horas, amanhã com qualquer de nós. Se há momentos em que o direito à indignação deve soar bem alto, este é um deles. Juízes a meter jornalistas na ordem? Não, muito obrigado. Pela minha parte, aqui fica a garantia: com toga ou sem toga, não vão domesticar-nos.

Não vão domesticar-nos (1)

É ilegítimo que o poder judicial pretenda violar o segredo profissional dos jornalistas – pedra angular do Estado de Direito – a pretexto de um suposto crime de acesso ilícito a dados individuais, que teria sido cometido pelo diário 24 Horas. É preciso dizer sem reticências: o 24 Horas não cometeu crime algum. Pelo contrário, ao revelar a existência do Documento 9, que confirma ter havido uma indexação indevida ao processo Casa Pia de uma lista com cerca de 80 mil telefonemas feitos por personalidades portuguesas insuspeitas de terem cometido qualquer crime, o jornal cumpriu a sua missão de informar, desempenhando um inegável serviço público. A perseguição judicial ao 24 Horas constitui um precedente gravíssimo, inédito em regime democrático, que configura uma inadmissível tentativa de “domesticação” dos jornalistas portugueses.

Serralves na Assembleia: uma estopada com guia

Visitar a exposição que a Fundação Serralves está a fazer na Assembleia da República, como eu fiz há dias, é uma estopada das antigas. Não vou entrar no mérito das obras expostas, nem na sua estafada "descontextualização" . O grande problema é que a exposição só pode ser visitada em grupo e é guiada por uns jovens formados em História de Arte, Belas Artes ou algo no género. Não sei se os organizadores têm medo que os visitantes se escondam nos Passos Perdidos ou que tenebrosos monárquicos como eu profanem o busto da república, mas a verdade é que somos obrigados à excursão pastoreada.
Logo à partida, embirrei com a jovem que nos calhou, com voz pedante e ar de quem, apesar dos seus profundos conhecimentos, nos ia transmitir de forma leve e divertida os segredos da Arte Moderna. Estimulados pela guia, houve de imediato uma pequena disputa entre dois ou três imbecis para provar quem era o mais engraçado do grupo. Mal eu vi no que me tinha metido, comecei a deixar-me ficar para trás, mas não conseguia escapar às explicações. Tudo "remetia" para alguma coisa, cruzavam-se "círculos privados" com "círculos públicos", por cada três frases havia um "se quiseremos", e por aí fora. Apostando na interactividade, a guia perguntou ao grupo se sabiam qual era o material em que era feito uma das obras. Um jovem de ar truculento pôs-se a dar-lhe pancadinhas com os nós dos dedos e, perante a advertência da guia para não o fazer, deu categoricamente uma resposta que mostra anos de profunda reflexão: "A Arte é para se tocar!". Mas o maior chato do grupo era um arquitecto escanzelado, careca e com a barba por fazer que decidiu mostrar que sabia mais do que a guia e lhe contrapunha argumentos tratando os artistas pelo primeiro nome, com pérolas como "nesta fase, o Pedro estava fascinado pelos cinzentos".
A meio da visita já tinha perdido a esperança, mas a minha mulher disse-me que no fim iríamos visitar o hemiciclo e isso deu-me um grande ânimo. Já tinha estado nas galerias e nos corredores, mas gostei muito da perspectiva de andar à solta entre as bancadas e ter a perspectiva da vida parlamentar de um Louçã, de uma Odete ou de um Hasse Ferreira. E, de facto, acabou por compensar um pouco a estopada, sobretudo porque encontrei uma alma gémea na pessoa de uma saudável velhota, que já tinha visto rir a bom rir de uma instalação-vídeo de Bruce Nauman que mostrava um casal à chapada "enquanto representação das tensões do mundo urbano" (guia dixit), estava tão encantada quanto eu por estar no hemiciclo. E que, vingando-me da minha silenciosa cobardia, confrontou a guia, dizendo-lhe olhos nos olhos: "esta foi a parte da exposição de que gostei mais".

quinta-feira, março 09, 2006

Começar bem

Cavaco Silva fez um bom discurso. Sem retórica, com substância. Retive em particular a exigência do novo Presidente quanto aos "critérios de mérito" nas nomeações para altos cargos não electivos do Estado e da Administração Pública, bem como a determinação que demonstrou no combate à corrupção. "Serei o Presidente de Portugal inteiro", assegurou Cavaco, arrancando aplausos até da bancada socialista em São Bento. Comunistas e bloquistas não aplaudiram, o que revela falta de sentido de Estado. Alguém verdadeiramente se admirou?

Mau perder

Mário Soares abandonou São Bento sem cumprimentar o novo Presidente. Partiu tão rápido que nem esperou pela mulher, Maria Barroso. Percebe-se bem. Ainda não conseguiu digerir os resultados eleitorais.

E ciao

Para todos os efeitos, este tornou-se, quase desde o início, no blog do PC, com esporádicas contribuições do Duarte e, mais recentemente, do FAL. Com excepção das escassas colaborações iniciais, sempre me senti mais um espectador, nem sempre atento nem obrigado, dos posts torrenciais do PC. É altura de voltar para a bancada.

A direita em Belém (3)

Com a possível excepção de Costa Gomes (1974/76), por sinal antigo membro do Governo de Salazar, o primeiro Presidente claramente de esquerda após o 25 de Abril de Abril foi... Jorge Sampaio. Findo o ameno interregno sampaísta de dez anos, portanto, a direita está neste momento não a estrear mas a recuperar Belém. Nada mais natural, nada mais previsível. A esquerda – a verdadeira esquerda, sem camuflados nem camuflagens – adapta-se mal a viver em palácios.

A direita em Belém (2)

A julgar pelas aparências, a esquerda só em 1986 – com Mário Soares – passou a ocupar Belém. Concedamos, no entanto, que era uma esquerda sui generis. Afinal foi Soares quem reabilitou esse vulto impante da contra-revolução chamado António de Spínola. Foi também Soares quem sempre apostou em Savimbi como figura tutelar de Angola, contra o MPLA de cartilha marxista. Foi ele quem nomeou Soares Carneiro como chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas. E – last but not the least - não esqueçamos que foi ele ainda quem escancarou as portas à maioria absoluta de Cavaco, em 1987, ao inviabilizar uma alternativa socialista em São Bento. Vinham muito longe os tempos em que garantia “não dormir descansado” com Cavaco no poder... E aliás não foi ele reeleito em 1991 com o apoio maciço do PSD?

A direita em Belém (1)

Diz-se por aí que com a chegada de Cavaco Silva ao Palácio de Belém a direita passa a ocupar pela primeira vez a Presidência da República no actual regime. Pergunto: Ramalho Eanes é de esquerda? O homem que meteu a esquerda militar nos eixos a 25 de Novembro de 1975 e chegou oito meses depois a Belém com o apoio expresso do PSD e do CDS (além do PS), enfrentando a oposição clara das forças comunistas e aparentadas, será de esquerda? Arrisco pouco se disser que não. Mais: comparado com Eanes, um oficial-general de perfil conservador, quem quase parece de esquerda é o próprio Cavaco.

Cavaco em Belém

Deixem-no trabalhar.

A pergunta que hoje devemos fazer

Estamos melhor ou pior do que estávamos há dez anos?

As palavras dos outros

"Jorge Sampaio comportou-se como o presidente do conselho fiscal do formalismo constitucional."
(Carlos Abreu Amorim, RTP-N, 8 de Março)

Na despedida de Sampaio

"Do justo e duro Pedro nasce o brando
(Vede da natureza o desconcerto!),
Remisso e sem cuidado algum, Fernando,
Que todo o Reino pôs em muito aperto,
Que, vindo o Castelhano devastando
As terras sem defesa, esteve perto
De destruir-se o Reino totalmente,
Que um fraco rei faz fraca a forte gente."
(Camões, Os Lusíadas, III, 138)

Até tu, Pacheco?

Acabo de ver a Quadratura do Círculo e estou em estado de choque. Ver o meu guru Pacheco Pereira (uma das pessoas que, apesar de não o conhecer pessoalmente, me fez entrar no PSD) classificar de "excelente" a presidência de Jorge Sampaio é uma grande desilusão. Nunca pensei que fosse tão pouco exigente ou que se deixasse cegar desta maneira inferior pelo ódio a Santana Lopes e a Paulo Portas. Nem vou entrar na responsabilidade de Sampaio no descalabro guterrista, uma época que Pacheco tão bem criticou, ou na sabotagem que ele fez aos esforços de Manuela Ferreira Leite, uma das pessoas que Pacheco sempre elogiou. Lembro apenas que foi graças a Sampaio que perdemos um ano entre a saída de Durão, que poderia ter sido substituído com normalidade e não com o dramatismo dos 15 dias de "reflexão" sampaísta que minaram à partida o governo de Santana (e Pacheco achou muito bem que Sampaio lhe impusesse um "droit de regard"...) e a tomada de posse do novo governo socialista. Os empresários pararam os investimentos, a retoma, que dava os primeiros sinais, foi à vida, e continuamos a atrasar-nos alegremente entre a banalidade dos discursos vazios de Sampaio. São desilusões destas, provocadas por pessoas que são o melhor que nós temos, que me fazem acreditar que realmente este país é inviável.

quarta-feira, março 08, 2006

Comentador ou político no activo?

Ainda sobre a estreia televisiva da saison, notei que Paulo Portas fez um esforço imenso para não comentar algumas matérias sobre as quais deve ter opinião enquanto comentador de política nacional, internacional e de outras artes. Falo da actuação de Jorge Sampaio na área da Defesa Nacional e de algumas perguntas bem directas de Clara de Sousa. Portas refugiou-se na relação que teve com Sampaio enquanto ministro da tutela e fugiu a sete pés do tema. Não pode. Outro momento onde se confundiu o comentador com o político (ainda no activo?) foi a necessidade de reiterar que terá votado por duas vezes (1996 e 2006) no prof. Cavaco Silva. Ora, como se sabe, na primeira vez o voto em Cavaco foi "concertado" com um voto em branco oficial do seu partido e da segunda foi "concertado" com a defesa insistente de um candidato alternativo no centro-direita por parte de vários dos seus seguidores... Mas, sinceramente, gostei mais de o ouvir falar de filmes, arte que muito aprecia, e da qual se considera fanático.

Diálogo (muito à portuguesa) entre jornalistas

- Vais lá?
- Lá onde?
- À posse.
- Mas porque perguntas?
- Só por perguntar.
- Vá lá, desembucha.
- Andas diferente. Sempre de gravata, nos últimos dias. Deixaste de vir trabalhar com os jeans coçados e aqueles ténis sebentos que nunca largavas. Até já fazes a barba!
- Eh pá, reparas em tudo.
- Pensei que tinhas recebido um convite.
- Convite de quem?
- Deles. Dos gajos.
- Do...
- Sim. Eh pá, eu sei que não votaste nele. Aliás, ninguém na Redacção votou. Mas apareceres aqui de gravata todos os dias faz-me pensar.
- Pois. É a posse.
- O quê?!
- Topaste mesmo a coisa. Vou assistir à posse.
- Eu bem sabia...
- E não é só isso.
- É o quê? Despeja o saco, pá.
- Tinhas razão há pouco. Quando falaste em ser assessor.
- Vais para lá?
- Não é bem. Ir, não sei se vou. Mas gostava. E estou a mexer-me para isso.
- Ah, eu sabia que havia coisa. Mas olha lá: tu és de esquerda, como eu, e nem votaste no tipo!
- Vou contar-te um segredo. Mas jura que fica entre nós.
- Juro, juro.
- À última hora mudei de ideias e votei mesmo nele.
- Ah, que coincidência. Engraçado que me digas isso. É que eu acabei por votar nele, tal como tu. Achas que é possível arranjar-se lá um lugarzinho também para mim?

Em jeito de balanço

Ao longo de dez anos, alguém ouviu uma palavra - uma só palavra - de Jorge Sampaio contra os sucessivos atropelos às mais elementares regras democráticas cometidos na Região Autónoma da Madeira?

O Paulo na SIC

Duas notas soltas sobre a estreia, ontem à noite, de Paulo Portas como comentador político da SIC: O cenário é tenebroso e o material faz mesmo lembrar aquela parafernália de objectos de vidro que na nossa província (e não só) abundam nas "salinhas" de estar, muitas vezes em cima das "TVs"; o look - onde são agora visíveis fartas patilhas (vão mesmo abaixo do lóbulo da orelha) - apanhou certamente muitos telespectadores de surpresa.

Largo ou Larga?

Governo é substantivo masculino. Como passará a denominar-se em nome da "igualdade de género"? E o Largo do Rato manterá o nome ou adoptará uma designação sexualmente mais correcta?

Quota feminina no clube dos machos

O PS tem como presidente um homem. E também um homem como secretário-geral. E indicou um homem para presidente da Assembleia da República. E para a presidência do Banco de Portugal. E para procurador-geral da República. E só está representado por homens no Conselho de Estado. E formou um governo de onde as mulheres estão quase ausentes. Pois este mesmo PS atreve-se a impor quotas sexuais de 33% nas listas eleitorais dos outros partidos. Em nome - dizem eles - da paridade. Ficamos a saber que para o PS "paridade" é sinónimo de um terço. Ficamos a saber também que o PS quer impor por decreto em domicílio alheio o que não pratica na sua própria casa. Ficamos a pressupor ainda que no governo de Sócrates permanecerá tudo na mesma: onde há galo não piam galinhas. Uma espantosa noção de coerência, a destes machos socialistas que conseguem suscitar manchetes sérias com o mais disparatado dos projectos.

Qualidade

A proposta do PS de tornar obrigatória uma quota mínima de deputados de cada sexo parece uma ideia peregrina e tipicamente burocrática. As mulheres são tratadas como minoria e de forma paternalista (e porquê um terço, em vez de um quarto ou metade?). Mas o problema, na minha opinião, não está no conceito de quota, mas na questão da democracia. A ser aprovada a proposta, a restrição legal não é sobre o número de homens e mulheres, mas sobre a qualidade da democracia. E este é o grande problema do parlamento. Os partidos têm degradado a excelência das suas listas e a proposta só iria diminuir ainda mais o mérito dos eleitos, não porque as mulheres sejam incompetentes, mas porque haveria mais uma restrição a somar às existentes: quotas para os barões partidários, para jovens aprendizes de políticos que nunca trabalharam na vida, para as diferentes facções ideológicas, para interesses económicos, para “senadores” do partido, para distritais, sem mencionar os ornamentos intelectuais das listas e o ocasional candidato mediático. Depois queixem-se de que as pessoas de qualidade estão a sair da política!

terça-feira, março 07, 2006

Guerra de civilizações 12

- A minha bomba é maior que a tua.
- Mas a minha mata mais depressa.

Crise em Hollywood

Hollywood já não esconde a sua crise. Nas ideias, histórias, temas, no excesso de custos, nas modas e na ditadura do politicamente correcto (outra maneira de dizer falta de ideias). Não me refiro à noite dos óscares, mas sim ao cinema americano pré-fabricado nos últimos dez anos pela indústria de Hollywood e onde não me lembro de nenhum filme que sobreviva uma década. Assistimos ao que parece ser o esmagamento da concorrência (a eliminação da concorrência) e o triunfo de uma determinada linguagem. Este produto geneticamente modificado tornou-se dominante e toda a gente no mundo engole aquilo em quantidades que geram lucros fabulosos. No entanto, a globalização tem um problema. O custo é tão grande que bastarão dois ou três fracassos para arruinar a indústria. Em compensação, as alternativas são baratas e a tecnologia digital também significa democratização. Mais grave será o efeito do tédio. Fartos de comer sempre a mesma dieta de filmes previsíveis, os espectadores vão aderir a outra coisa qualquer.

Um mês

O "Corta-Fitas" faz hoje um mês. Cabe-me a mim - logo a mim, que estive praticamente desaparecido destas andanças (e de outras) durante todo este tempo - assinalar a data e lembrar alguns dados interessantes: o blogue já foi visitado por mais de 1400 almas, correspondendo a mais de 430 entradas por semana e cerca de 110 por dia. No total, foram colocados online 242 posts (243 com este) e dizem-me que acabámos por ser citados e/ou referenciados na maior parte dos blogues mais ou menos interessantes que por aí se vão lançando. Alguns dos nossos leitores estão em Inglaterra, no Brasil (quem será?..), em Malta (ui..), na Índia ou em Macau. Isto dá uma pequena ideia do que é este mundo novo. Parece que valeu a pena, não?

Saudades do sampaiês 1

"Sem o desenvolvimento de uma abordagem cooperativa da paz e da segurança dificilmente conseguiremos ultrapassar a fragmentação, o caos e o vazio político." (Jorge Sampaio, Oslo, 4 de Fevereiro de 2004)

Evidentemente

Nada funciona tão mal em Portugal como a justiça.

Uma vergonha

O tribunal de Amarante condenou um indivíduo que em 2002 matou duas pessoas no IP4 - quando guiava em excesso de velocidade - a sete meses de inibição de condução e dois anos e dois meses de prisão, com pena suspensa. Com a devida vénia ao douto tribunal, esta sentença é uma vergonha. E um insulto à memória do casal morto nesse acidente, que deixou órfã uma bebé de quatro meses.

As palavras dos outros

"Se os juízes ou os médicos fizessem um quinto do exame crítico deontológico dos jornalistas o mundo seria um lugar muitíssimo melhor."
Paulo Varela Gomes (RTP-N, 1 de Março)

Notícias inúteis 12

O Marco não foi preso, apesar de também ter entrado no Big Brother.

Notícias inúteis 11

O Mário, aquele tipo do Big Brother, foi preso.

A fechar

"'Quando chegarmos à cidade!'"
(Última frase do mesmo romance. Edição: Livros do Brasil. Tradução: Mário Henrique Leiria)

A abrir

"Era um prazer muito especial ver as coisas arderem, vê-las calcinar-se e mudar."
(Frase de abertura de Fahrenheit 451, romance de Ray Bradbury)

Acto de contrição

Se quem hoje me elogia já elogiou a "democrática" Coreia do Norte, algum pecado devo ter cometido. Sinto-me licencioso. Que Alá me perdoe. E Jeová. E Buda. E Nossa Senhora de Fátima. Amen.

Perguntar não ofende

Autoridades sanitárias aconselham os consumidores a evitar todos os "contactos íntimos" com aves. Tudo bem. Só não percebo como é possível um ser humano manter "contactos íntimos" com aves. Vou perguntar à drª Marta Crawford e já vos digo.

segunda-feira, março 06, 2006

A blasfémia do dia (XVII)

Apanhei um pifo dos antigos para festejar a vitória contra os sauditas.

Petição a Sampaio

É uma injustiça terminar o mandato sem lhe pôr uma comenda ao peito, senhor Presidente. A ele, um dos raros portugueses que ainda não foram agraciados por Vossa Excelência. Refiro-me a esse lídimo portador dos valores da cidadania que não hesita em olhar-nos de frente cada vez que surge na pantalha, o que aliás acontece com frequência. O Emplastro.

Compreensão lenta

Porque será que as mulheres gostaram mais do Segredo de Brokeback Mountain do que os homens?

Os 'meu

Quais as películas galardoadas com o Óscar de melhor filme que prefiro? Segue a lista. Anos 30: Uma Noite Aconteceu (Capra, 34). Anos 40: Casablanca (Curtiz, 43). Anos 50: Eva (Mankiewicz, 50). Anos 60: Lawrence da Arábia (Lean, 62). Anos 70: O Padrinho e O Padrinho II (Coppola, 72 e 74). Anos 80: Amadeus (Forman, 84). Anos 90: A Lista de Schindler (Spielberg, 93). Anos 2000: Sonhos Vencidos (Eastwood, 04).

Tão "especialistas" que eles são

Todos os "especialistas" em cinema que peroraram nos ecrãs imediatamente antes da distribuição dos Óscares davam como garantida a atribuição da estatueta de melhor filme a O Segredo de Brokeback Mountain. Os factos demonstram até que ponto é que esta brilhante rapaziada percebe mesmo do assunto.

Rever 'Colisão'

Com urgência. Numa sala de cinema, comme il faut. O distribuidor estará atento?

Surpresa, surpresa

Colisão, o meu favorito, ganhou: é o melhor filme do ano. Uau, valeu a pena estar acordado. Leva também Óscares para melhor argumento original e melhor montagem. Surpresa generalizada na plateia: O Segredo de Brokeback Mountain, talhado à medida para o prémio máximo, fica-se pelo Óscar de melhor realização, atribuído a Ang Lee. Desta vez houve justiça. Para o ano há mais.

Rachel

Linda Rachel Weisz. Merecidíssimo Óscar para melhor actriz secundária. Só não percebo o qualificativo. Secundária, senhores da Academia?!!!

In memoriam

Gosto do momento in memoriam, celebrando gente do cinema falecida durante o ano que ficou para trás. Gente como Simone Simon, Anne Bancroft, Shelley Winters, Teresa Wright. Actrizes eternas.

George

Matt Dillon, o meu favorito para melhor actor secundário, derrotado por George Clooney num dos papéis mais imbecis que tenho visto nos últimos anos.

Discriminação

Alguém percebe estas regras? Os dois protagonistas do Segredo de Brokeback Mountain estão nomeados: um como actor principal, outro como secundário. Apesar de dividirem o ecrã durante quase todo o filme. Absurda discriminação.

Ao largo dos Óscares

Não esqueçamos que alguns dos melhores filmes de sempre passaram ao largo dos Óscares. Filmes como Tempos Modernos (Chaplin, 36), O Mundo a Seus Pés (Welles, 41), Do Céu Caiu uma Estrela (Capra, 46), O Crepúsculo dos Deus (Wilder, 50), Serenata à Chuva (Kelly-Donen, 52), A Desaparecida (Ford, 56), Esplendor na Relva (Kazan, 61), Lilith (Rossen, 64), Apocalypse Now (Coppola, 79), ET (Spielberg, 82), A Rosa Púrpura do Cairo (Allen, 85) e As Pontes de Madison County (Eastwood, 95). Nenhum deles precisou da caução da estatueta para ser uma obra-prima.

Como todos os anos

A longa maratona dos Óscares, madrugada adiante.

domingo, março 05, 2006

Dois bloquistas ao telefone

- Camarada, temos de reunir com urgência a Mesa Nacional.
- Porquê? Este fim de semana não dá: já tenho bilhete para o futebol.
- Já te disse que é urgente. E é muito grave. O Fazenda cometeu um sério delito pequeno-burguês que o desqualifica como nosso líder parlamentar.
- Mas o que foi, camarada?
- Usou gravata no Palácio de Belém. Vi as imagens na íntegra que um camarada nosso da SIC me disponibilizou: o Fazenda estava de gravata e sorria, todo satisfeito. Vamos reunir já a Mesa Nacional. Forçamos o gajo a fazer uma autocrítica do caraças. Ou então é expulso.
- Tens toda a razão. Se quer usar gravata ele que vá para o PS! A malta é assim. A malta não transige em questões civilizacionais.

Homenagem mais que póstuma

Que dirá desta homenagem mais que póstuma de Sampaio a Teixeira Gomes aquela esquerda pós-moderna que gozou com Manuel Alegre por ter feito tantas "romagens a bustos" durante a campanha presidencial?

Um escritor que ninguém lê

Jorge Sampaio, autor de tantas frases que ninguém compreende, deu-se agora ao incómodo de voar para a Argélia com o intuito de homenagear Teixeira Gomes, um escritor que ninguém lê.

Dicionário de politiquês (IX)

Vertente. Metáfora muito usada por políticos com queda para videntes - aqueles que vêem a economia trepar em gloriosa ascensão vertente acima, enquanto o comum dos mortais só consegue enxergá-la em vertiginosa queda vertente abaixo.

sábado, março 04, 2006

Dicionário de politiquês (VIII)

Multidimensional. Forma modernaça de um político dizer tudo e o seu contrário. Ou seja, nada.

O dislate da semana

"Eu lutei para haver democracia quando o senhor ainda não era nascido ou andava de cueiros." (Freitas do Amaral para Telmo Correia, de 45 anos, na Assembleia da República, 2 de Março)

Primeira lição de inglês às criancinhas

Gude móningue. Ai laique mai scul. Ende ai laique José Sócrates véri matche. I ise véri véri véri gude. Bai bai.

Mera coincidência

"A paz não se constrói deitando achas para a fogueira." Chamberlain em 1938? Não: Freitas em 2006.

Megalomania?

Há tecnologias mais sofisticadas, mas a co-incineração avança. Só ganha meia hora em relação a comboios já existentes, mas apesar do custo exorbitante, o TGV Lisboa-Porto avança. Fica a 60 quilómetros da maioria dos seus utilizadores, mas o aeroporto da Ota avança. Como avançaram os dez estádios de futebol do Euro 2004, Alqueva, Sines e outros projectos megalómanos. E, se formos ao passado, temos no Convento de Mafra bom exemplo de como estoirar recursos. No futuro, não acredito que o país possa escapar a uma central nuclear que várias gerações vão pagar, em vez de se apostar em energias renováveis. Não me ocorre afirmar que os outros países não fazem coisas estúpidas, mas existe em Portugal uma teimosia cega que leva todas as críticas à frente. Lisboa e Porto apodrecem devagar porque os governos não conseguem resolver a questão do arrendamento; Portugal é o país com maiores atrasos em educação na União Europeia; justiça, saúde e ensino são cada vez mais para ricos. Talvez estes bloqueios, que ninguém quer solucionar, só tenham mesmo uma saída: a fuga para a frente dos grandes projectos.

Gostei

De ter ouvido o Carlos Abreu Amorim e o Paulo Varela Gomes, no cada vez melhor Choque Ideológico, da RTP-N, criticarem em uníssono o procurador-geral Souto Moura por ter "tomado o freio nos dentes" na sua recente ofensiva contra os jornalistas. Felizmente, tanto quanto sei, até ao momento nenhum deles recebeu uma visita da Judiciária a mandá-los tirar os dedos do teclado. Ou a afastá-los do microfone.

Boletim meteorológico

Chuva e mais chuva e mais chuva e mais chuva. Será que este Inverno nunca mais acaba?

sexta-feira, março 03, 2006

Dicionário de politiquês (VII)

Contratualizar. Contratar por tempo indeterminado com a bênção de uma santa. Exemplos: obras de Santa Engrácia; metro Praça do Comércio-Santa Apolónia.
(Agradeço o contributo do meu amigo João C. nesta entrada)

Perigo I

Os nossos amigos de Mau Tempo no Canil levantam a questão do perigo do conflito no Iraque. Penso haver dois problemas no raciocínio ali desenvolvido: o que diz Bin Laden (mesmo que seja autêntico) revela apenas que a estratégia dos líderes da rede terrorista fracassou, pois não existe “guerra total”, mas apenas sentimento generalizado de insegurança. Os terroristas têm meios para fazer estragos e muitas vítimas (já o provaram), mas não possuem capacidade para vencer o Ocidente.
Isto não desmente a principal conclusão de Francisco (o conflito do Iraque tornou o mundo mais perigoso), mas parece-me que os motivos são outros. Em primeiro lugar, cria-se instabilidade numa região onde se concentram três quartos das reservas petrolíferas mundiais (mas convém lembrar que Saddam Hussein não era uma garantia de estabilidade); a guerra está a radicalizar os países muçulmanos, sendo este um aspecto mais difícil de compreender, relacionado com o sentimento de exclusão dos activistas religiosos e a aparente confirmação das teses segundo as quais o Ocidente quer destruir o Islão. Isto parece dificultar as reformas em países islâmicos, aspecto que já tentei explicar num texto anterior.

Perigo II

É necessário mencionar outros factores de desordem menos óbvios. Na realidade, a ocupação do Iraque constitui uma espécie de operação policial de tipo imperial, não muito diferente, em escala, das que outros impérios realizaram no passado. Se degenerar em guerra civil iraquiana ou pântano militar, o resultado da acção será semelhante ao de uma intervenção britânica nos anos 20, no mesmo território. Mas, desta vez, os efeitos globais serão mais sérios, pois durante décadas a América evitará intervenções externas e a aliança ocidental ficou entretanto debilitada, com alguns europeus ridicularizados e avaliados como parceiros menores.

A blasfémia do dia (XVI)

Senhores embaixadores, depois de muito cogitar apresento-vos a solução que trará a paz no nosso tempo: um campeonato euro-árabe de futebol... feminino.

Notícias inúteis 10

A gravata de Fazenda combinava bem com o tom da camisa.

Notícias inúteis 9

Luís Fazenda, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, apareceu de gravata num almoço oferecido por Jorge Sampaio a dirigentes partidários.

Cenas da vida parlamentar

- Vossa Excelência usa cueiros.
- Vossa Excelência não muda as ceroilas.
- Vossa Excelência cheira a bedum.
- Vossa Excelência tresanda a fartum.
- É preciso ter topete!
- Venha cá se é homem. Eu é que o piso no tapete!